Lua Astrológica
O ciclo da Lua é o cicerone da impermanência ordenada da vida.
A Lua astrológica é arquetipicamente a guardiã das nossas memórias, senhora das águas das nossas emoções, condutora dos ribeiros da nossa intuição e da nossa vinculação à vida.
Madrinha da noite e dos nossos processos mais escuros e inconscientes é ela que comanda arquetipicamente as nossas marés internas, consoante a sua fase e signo por onde transita, irá ora trazer à costa o que precisa ser revelado, ora arrastar para o mar profundo o que precisa ser absorvido pelo vazio.
A lua astrológica rege as marés cheias e vazias do oceano da nossa Alma. O seu ciclo que dura aproximadamente 29 dias, reflete numa fração, que se repete a cada mês, não só os ciclos da natureza, como os ciclos de relação interpessoal no nosso planeta.
A lua é a barqueira das águas da alma.
Sempre tive a Lua como “madrinha”,
desde a adolescência, quando a minha fome de liberdade e introspeção me levavam a grandes passeios ao luar pelo calçadão de Cascais. Tantas vezes inspirada pelos livros do Jorge Amado, que devorei avidamente na idade dos antagonismos. “Pastoreávamos a noite” escrevia o célebre autor na primeira linha do seu romance, Os Pastores da Noite. Assim o fazia eu, guiada pela Lua, pastora da noite e dos seus mistérios.
O Ciclo da Lua
O ciclo da Lua convida-me diariamente a “pastorear” a minha noite, ou seja, o território desconhecido dos meus sentimentos, emoções e vazios através da sua transitoriedade. Tal como a Lua que se mantém em constante movimento, mudando diariamente, também mudam as nossas emoções e disposições, neste espaço interno, escuro e fértil que nos permeia, o nosso subconsciente.
Faço uma pausa enquanto escrevo estas palavras,
a casa finalmente silencia. O fogo exala o seu último suspiro e a cadela enrosca-se nela mesma para se ajustar à falta de calor. Paro de escrever para não incomodar o silencio. Lá fora a coruja pia num compasso ritmado, quase que consigo contar os intervalos do seu chamado solitário.
A noite é fria, por entre as mantas afino a visão, fecho o computador por momentos para apreciar o espetáculo sem distrações, aquele momento em que a “madrinha” chega, vestida de prata e glória, penetrando de mansinho através dos vidros e afaga-me a face. Vejo de repente nascer uma nova realidade – a realidade lunar. Tudo brilha, numa qualidade noturna e sábia que só a lua sabe conferir. O que ainda há pouco estava na sombra revela-se perante os meus olhos e sei no meu coração que esta revelação é uma oportunidade. Agradeço e aspiro os raios prateados da Lua através dos meus pulmões, na esperança de iluminar os cantos côncavos do meu interior.
Posso sempre contar com a “minha madrinha”, não importa onde vivo, a minha idade ou a condição socioeconómica.
Todos os meses,
quando a Lua chega ao culminar do seu afastamento do Sol e se faz cheia repete-se o mesmo ritual, independentemente da estação do ano ou de estar pessoalmente disposta a receber, ou não, as suas bênçãos e revelações. Dentro da impermanência que caracteriza a vida, de tudo o que é incerto neste mundo, sei que posso sempre contar com a Lua cheia. Virá pontualmente adornar a minha sala com a mais fina luz de prata e iluminar os cantos mais escuros e inacessíveis do meu interior.
Observar a lua transformar-se dia a dia, ciclicamente, deu-me chão e segurança numa fase da vida onde tudo muda constantemente, onde de meninas passamos a moças e de moças a adultas, numa velocidade que mal dá para fazer despedidas do que foi e do que pensamos que queremos ser.
Trabalho como astrológa desde os 22 anos de idade. No entanto apesar das fases da Lua e o zodíaco, estarem intimamente ligados, só lhes uni as pontas há alguns anos.
Aos 20 estava, como é próprio da idade, estava muito investida em desenvolver-me intelectualmente e lutava para provar que era digna de me sentar à mesa dos adultos, que é como quem diz, ser aceite pela sociedade. Há sempre uma fase das nossas vidas onde parece que não há tempo para as coisas menores e infantis, onde temos que cortar com os laços que nos ligam ao maravilhamento da infância. A verdade é que maravilhamento e vulnerabilidade andam de mãos dadas e nessa altura eu fugia a sete pés de qualquer coisa que me pudesse fazer sentir frágil. Foi assim que deixei para trás a simplicidade de cultivar uma relação viva com o céu estrelado essa que cultivava aos 15/16 e agarrei-me aos livros para entender o mundo.
Aprendi a contemplar os céus muito nova,
graças á minha mãe. Nas noites mornas de verão, sentava-me no seu colo e juntas contemplávamos a paisagem noturna.
A vista era a de um descampado sobre o qual se ergue a capela de Nossa Senhora de Porto Salvo.
Reza a lenda que após um naufrágio, um grupo de marinheiros andava no mar à deriva e tiveram uma visão de Nossa Senhora, que lhes disse que se rezassem com fé, os guiaria até um porto seguro. Foi assim que os marinheiros chegaram ao lugar conhecido agora como Porto Salvo, uma freguesia que pertence ao concelho de Oeiras. Ergueram então uma capela em honra de Nossa Senhora como forma de agradecimento.
No entanto, apesar da materialização de um milagre mariano em frente à janela, eu e a minha mãe, elevávamos o olhar para o céu estrelado e eram as estrelas e as árvores, cujas copas competiam com o 2º andar onde vivíamos, que nos serviam de altar.
Este talvez tenha sido o maior presente que recebi na vida, o mais importante de todos: saber ver na natureza o meu altar.
É sob um céu semelhante, num outro lugar, livre de candeeiros que contaminam a vista, que escrevo este artigo.
Olho para a minha relação com o ciclo da Lua e a astrologia como uma herança, que começou a ser tecida na pré-história, quando começámos a perceber a ligação entre o cosmos e os ciclos da Terra. Esta foi passada de geração em geração por parteiras, curandeiras, agricultoras, pescadores e tantas outras artes ligadas à terra e à sobrevivência das comunidades.
A relação íntima e profunda com o ciclo da Lua surgiu na minha vida depois de um sério esgotamento, tinha 35. Supostamente, depois de estar desde os 19 anos profundamente ligada ao desenvolvimento espiritual e pessoal, deveria ter conseguido as ferramentas necessárias para não cair, não desabar, não perder o controle da vida, mas a vida, tal como a Lua, tem os seus ciclos e estes ciclos não se controlam, navegam.
O encontro diário com o ciclo da Lua pelo zodíaco e as fases do ciclo Lua/Sol que mantenho desde então têm-me ensinado, através da presença e da auto-observação a entender e aceitar o fluxo da vida. A respeitar as alturas de pousio, a hora de avançar e colocar as sementes à terra, a hora de ser disciplinada e consistente, a hora de aproveitar expandir as asas e voar e o tempo de não fazer nada acolhendo a velha morte.
Talvez a lição mais importante que aprendo todos os dias é a de me relacionar com o tempo e o espaço desde um profundo sentido de respeito e curiosidade. Esta curiosidade por sua vez fomenta o meu sentido de pertença à vida, ao mundo e ao “corpo das coisas”.
Lancei este mês o Curso Pastoras da Noite como um guia para a navegação e fluidez, dançado ao som da música das estrelas e do coro das águas que correm nas veias da Terra. A intenção é oferecer uma forma simples mas extremamente profunda de fortalecer diariamente a intenção de reencontrar o caminho para o centro – a âncora da nossa pertença à Vida.
Todos os meses, durante 29 dias, Sol e Lua dançam a dança arquetípica que espelha a dinâmica de todas as relações, refletindo as leis fractais da vida/morte/vida.
Todos os meses temos a oportunidade de aprender a observar, através da passagem da Lua pelos vários arquétipos do zodíaco, as várias nuances da nossa relação com o todo, representada arquetipicamente pelos signos e pelas geografias do zodíaco.
Observar e registar a nossa relação com o ciclo lunar oferece-nos a possibilidade de fazermos pazes com a “impermanência ordenada” da vida.
As inscrições estão abertas para o Curso que terá início em Março, podes saber mais aqui https://anaalpande.com/astrologia/cursos-astrologia/pastoras-da-noite/
Com carinho
Ana Alpande
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