Os Mandamentos da Vida Cíclica e a Arte de Tecer a Vida
Todo o meu trabalho não é mais do que um estudo aprofundado sobre a vida cíclica e como dançar com ela.
Ao crescer, as 4 estações e o calendário cristão foram impregnados nos meus sentidos devido ao ambiente familiar em que cresci. Mais tarde na adolescência ao ler Jung e Joseph Campbell, comecei a interessar-me pelos Mitos e a viagem do herói. E foi através dos 12 trabalhos de Hércules que cheguei à Astrologia.
E durante anos tudo isto era fascinante, talvez porque entre os 16 e os 24 eu vivia principalmente alimentada pelo Ar que me caracteriza. Mas depois fui mãe!!!
E ter sido Mãe virou a minha estrutura de cabeça para baixo, e realmente mudou de forma profunda a minha maneira de percepcionar a informação. Foi como se a minha inteligência tivesse sido desconstruída. O meu reino mental não teve fundações suficientes para a avalanche emocional que os primeiros anos de maternidade me causaram (a par da privação de sono). E o que me susteve foram as fundações que tive na infância, a certeza visceral que após um Inverno há sempre uma Primavera.
Foi aí que descobri a importância de reconhecer e respeitar a vida cíclica e mais ainda, foi aí que descobri que o mito do herói que tinha pautado o estudo de anos de vida, não era adaptado a mim, e isto simplesmente porque não sou um homem. Sou mulher!!!!
Então começaram as questões profundas, aquelas que nem a mente, nem todo o Ar do mundo são capazes de agarrar. E não há nada que doa mais a um intelectual, do que ter uma pergunta para a qual não se encontra resposta!
Foi aí… sim foi aí que a minha roda de fiar, as minhas agulhas de tricô e o meu tear me salvaram a vida. Foram eles que me ensinaram grande parte do que sei sobre a vida cíclica. Porque eles foram o espaço que eu estava a precisar para reestruturar as minhas fundações mentais e emergir com um nova forma de percecionar e entender o mundo à minha volta. Uma forma mais feminina, uma forma muito mais natural e adaptada à minha anatomia física, emocional e espiritual. Foi aí que percebi que os meus heróis eram todos homens e que eu sabia muito pouco sobre heroínas mulheres.
De repente ao passar noites a fio a fiar, fez-me olhar para as mulheres da aldeia, que eu visitava nas férias, com um renovado interesse que não tinha nada de intelectual, vinha diretamente do coração. A minha pergunta era: Como é que aguentam? Tanta dor, tanta castração, a falta de tanta coisa básica e ainda assim seguem em frente… como aguentam a violência, o trabalho efémero que nunca é reconhecido, as dores caladas, como?
Passamos a vida a renunciar a Dor, quando ela está intimamente enraizada na nossa existência.
A viagem da heroína é tão diferente da do homem. Na crista das crises as mulheres vão para dentro, para dentro das casas, para dentro de si próprias. As mulheres olham a dor de frente e sentam-se com ela frente às lareiras onde fiam e tecem as suas mágoas, encontrando a inspiração e a coragem de transformar a sua existência. Para uma mulher os trabalhos manuais simbolizam a alquimia entre a vida externa e a voz da Loba, aquela que vive no fim do tempo e tudo sabe… eles relativizam o tempo e ligam-nos à vida cíclica, porque tem uma estrutura ritmada, o constante girar do fuso, o andar para frente/trás/frente da lançadeira, a mão firme que da cada ponto minucioso numa espécie de transe.
A mim fascina-me a nossa coragem.
A grande maioria das mulheres com quem trabalho seja nos círculos, seja na astrologia, já viveram tanto, já sofreram tanto, e estão de pé e não desistem, porque dentro delas existe esta resiliência feminina ancestral, esta força que é a força das raízes mais profundas que nos ligam a todas. E porque estamos em círculo elas elevam a minha coragem, a força interior que preciso para não fugir da ferida, não fugir da dor.
Nós somos essencialmente lunares, podemos ter vários contornos e arestas cheias de força, explosão e expansão, óbvio que sim, mas quando chega aquela altura do mês somos chamadas à caverna e se dizemos que não, o nosso corpo grita, arqueja e queixa-se.
Mas, como todas estamos tão habituadas a ignorar a dor, tapamos orelhas, porque as necessidades dos outros falam sempre mais alto, e porque vivemos numa sociedade onde ou se é vitima ou se é bem sucedido, e não há grandes espaços pelo meio. É como se ouvir a dor seja igual a uma derrota, e nestas vidas ocupadas orientadas para o sucesso externo, quem tem dor é fraco.
Então quando mulheres me dizem que não entendem porque tenho de trabalhar com coaching criativo a par da tecelagem que é uma coisa tão demorada, quando me perguntam porque não faço o mesmo a desenhar, ou com processos mais fáceis e rápidos, ou workshops mais curtos por exemplo de um fim-de-semana, a resposta é clara:
Nós mulheres construímos do vácuo, daquele escuro primordial que suga.
Nós fiamos fios com o pó das estrelas e os filamentos mais frágeis das raízes das árvores.
Nós temos a capacidade de criar estrutura onde não havia absolutamente nada.
E não há nenhuma outra arte criada pelo homem que represente essa metáfora tão bem como a tecelagem.
E se falamos em Arte de Tecer a Vida, não podemos falar de um workshop ou fim-de-semana. Para além de tudo isto, sentarmo-nos e tecermos um eureka, uma invocação, uma nova visão, novas crenças, um sentido de pertença, é profundamente transformador. O tempo que vamos dedicar a criar do tal vácuo que falei, a viagem de andar para a frente e para trás no tear que representa a estrutura da nossa psique, o movimento dos braços e dos ombro, o silêncio, o transe e o espaço interno alimentados por horas, isso é o que faz com que o trabalho com o coaching, neste contexto de transformação profunda, seja realmente transformador para a psique feminina.
Então a Arte de Tecer a Vida não pode ser rápida, nem fácil, nem imediata. É lenta, tem passos, etapas que precisam de ser conquistadas tal como o mito dos nossos companheiros homens. Só que no nosso caso, nós não vamos à guerra com espadas e flechas perseguindo demónios para os conquistar, nós voltamo-nos para dentro e trabalhamos com as forças primordiais da natureza humana, aquelas que habitam os nossos ventres, e que são regidas pela nossa madrinha a Lua, nós incorporamos e transmutamos os demónios.
Da minha parte por tudo o que Sou e já vivi, não acredito muito em atalhos.
Mas acredito em escolhas e em transformações poderosas, confio na alquimia pura do coração humano.
E acredito, acima de tudo, no poder do círculo cíclico, razão pela qual escolhi este como o meu formato de trabalho.
Abraço cíclico a todas!
Mais sobre a Arte de Tecer a Vida – aqui
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